Por um Plano de Redução da Letalidade Policial e sua supervisão pelo Observatório Judicial sobre a Polícia Cidadã
O presente relatório, realizado pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (GENI/UFF) e o Datalab Fogo Cruzado foi elaborado com o intuito de fomentar o debate público e instruir o julgamento dos embargos de declaração no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental de nº 635 – a ADPF das Favelas. Na iminência da decisão do pleno do Supremo Tribunal Federal sobre a questão,
pretende-se oferecer subsídios empíricos e compreensivos, tendo como referência o voto do relator, Ministro Edson Fachin.

Realização:
GENI/UFF e Fogo Cruzado

Data:
Novembro 2021

Estudo revela alto grau de letalidade e baixo índice de comunicação de operações policiais ao Ministério Público

Supremo deve julgar na próxima quinta-feira (25) ação que estabelece série de medidas para evitar danos às comunidades e preservar vidas 

Estudo inédito elaborado com base em dados do Ministério Público Estadual mostra que quase metade das operações policiais realizadas no Rio de Janeiro não são comunicadas ao MP, conforme determinação do Supremo Tribunal Federal (STF). O índice é ainda maior quando consideradas apenas as operações da Polícia Civil, chegando a mais de 90% de subnotificação. Produzido pelo Grupo de Estudos de Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (GENI/UFF), o relatório “Por um Plano de Redução da Letalidade Policial e sua supervisão pelo Observatório Judicial sobre a Polícia Cidadã” considerou o período de junho a novembro de 2020, auge da pandemia da Covid-19, e também mostra o grau de letalidade dessas incursões.

Quanto maior o número de notificações, menor a probabilidade de mortes e, inversamente, quanto menor o número de notificações, maior a probabilidade de mortes. A Polícia Civil apresentou uma subnotificação de 91,1% e uma média de duas mortes por operação. Já a Polícia Militar, com uma porcentagem de subnotificação de 21,1%, registrou quatro mortes para cada dez operações – ou seja, uma taxa de probabilidade letal de 40%. 

A análise das comunicações foi elaborada a partir do mapeamento dos dados do MPRJ e da base de operações do próprio GENI/UFF. Durante o período analisado, 268 operações foram comunicadas ao MP, embora haja registros de 494 ocorrências de operações policiais, uma subnotificação de 45,7%.

Dentre as áreas geográficas da Região Metropolitana do Rio, é a Baixada Fluminense (66,6%) quem apresenta maior subnotificação e o Leste Fluminense (14,5%) quem apresenta menor subnotificação. A Capital tem 17,2% de subnotificações. 

Favorecimento de grupos armados

O estudo também comprovou a vantagem coercitiva das milícias em relação aos demais grupos armados no Rio. Nos bairros onde há predominância de territórios em disputa e onde o grupo armado predominante é o Comando Vermelho concentram a maior quantidade de operações policiais, embora as milícias já tenham controle da maior parte da cidade. Nos bairros sob o controle das milícias, inversamente, ocorrem poucas operações policiais. 

A análise dos dados foi possível por meio do  “Mapa dos Grupos Armados do Rio de Janeiro”, também lançado pelo GENI/UFF em outubro de 2020 (leia aqui). O cruzamento das duas bases permitiu que os pesquisadores pudessem distinguir entre grupos com vantagem política e grupos em desvantagem política, tomando como critério a menor ou maior incidência de operações policiais nas áreas por eles controladas.

Justificativa das operações policiais

Outro ponto de análise levantado na pesquisa é referente à arbitragem das justificativas enviadas ao MPRJ pelas forças policiais para a realização das operações. As duas motivações mais relatadas foram: interrupção de bailes funk (17,5 %) e a retirada de barricadas (9%). 

Segundo os pesquisadores, as motivações vão contra a decisão do ministro do STF Edson Fachin, no dia 5 de junho, proibindo operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro enquanto perdurar a pandemia de COVID-19. Baseada na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635 – a chamada ADPF das Favelas, a decisão determina que, “sob pena de responsabilização civil e criminal, não serão realizadas operações policiais durante a epidemia do COVID-19, salvo em hipóteses absolutamente excepcionais, que devem ser devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente, com a comunicação imediata ao MPRJ”.

“A análise dos dados mostra claramente que as forças policiais não enviam as comunicações de grande parte das operações policiais ao MPRJ e, quando enviam, os critérios não são compatíveis com as normativas feitas pelas próprias polícias. A falta de controle sobre as forças policiais contribui para a ineficiência, a brutalidade e a corrupção. É urgente que os ministros do STF votem a favor do plano de redução de letalidade policial e sua supervisão pela sociedade civil”,  explica o pesquisador Daniel Hirata.

O STF incluiu a ADPF 635 na pauta de julgamentos da próxima quinta-feira (25). A Ação estabelece uma série de critérios para a realização de operações policiais, com o objetivo principal de evitar danos às comunidades e a perda de vidas em confrontos que, como mostra o relatório, poderiam ser evitados. 

“Ações judiciais como a ADPF das Favelas são as iniciativas onde a ideia de um plano de redução da letalidade policial sob supervisão de um Observatório Judicial sobre a Polícia Cidadã vêm sendo discutidas em processos que envolveram movimentos de favela e de familiares de vítimas de violência de estado, organizações de direitos humanos, pesquisadores especialistas nos temas, partidos políticos e representantes de órgãos estatais” reitera o pesquisador.

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